NAVEGUE PELA COBERTURA EDUCOMUNICATIVA REALIZADA POR 100 ADOLESCENTES DO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO


8 de setembro de 2008

O participante do VI Simpósio, Veet Vivarta, em entrevista à revista eletrônica RESPONSABILIDADESOCIAL.COM


Veet Vivarta, o diretor-editor da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), explica o trabalho que vem sendo desenvolvido por essa ONG, não apenas no Brasil, como também na América Latina. Vivarta também comenta sobre as principais estratégias para engajar a mídia brasileira na causa de uma vida melhor para crianças e adolescentes. Ele também chama atenção para a emergência que há em se fazer cumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente em nosso país. Conheça, ainda, os maiores desafios da Andi e do Terceiro Setor na visão desse jornalista. Confira estas e outras questões na entrevista concedida a seguir:

1) Responsabilidade Social – Qual a missão da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI)?
Veet Vivarta – A ANDI é uma organização não-governamental, fundada por jornalistas em 1992, em Brasília. Nossa missão é contribuir para o aprimoramento da qualidade da informação pública em torno de temas considerados decisivos para a promoção e a defesa dos direitos da infância e da adolescência. Para isto, procuramos estimular um diálogo pró-ativo, profissional e ético entre os atores da sociedade civil organizada e a Mídia. A ANDI nasceu em um período extremamente importante, em que o Brasil começou a trabalhar pela implementação dos preceitos estabelecidos tanto pela Convenção Internacional dos Direitos da Infância quanto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. É nesses dois documentos que ainda hoje embasamos nossas posições e práticas. Nesse sentido, acreditamos ser fundamental a criação de uma cultura de co-responsabilidade pela qualidade da informação pública como condição estratégica para a inserção da criança e do adolescente como personagens prioritários na agenda nacional de desenvolvimento humano e social.

2) RS – Qual o objetivo da publicação anual da pesquisa “Infância na Mídia”?
VV – Durante o ano de 1996, por meio de parceria com o Instituto Ayrton Senna e com o apoio do Unicef, passamos a investigar a evolução do tratamento dado pelos meios de comunicação brasileiros às questões mais relevantes para a agenda dos direitos da infância e da adolescência. Para isso foi desenvolvida uma metodologia própria de classificação, utilizando um conjunto de indicadores, que é então aplicada a cada uma das reportagens cotidianamente selecionadas nos principais jornais e revistas do País. É a partir da base de dados alimentada por este processo de classificação que anualmente é elaborado o relatório analítico Infância na Mídia. A publicação apresenta grande variedade de números e análises qualitativas, identificando virtudes e limitações da mídia brasileira. A metodologia de avaliação permite radiografar diferentes indicadores, como o número de matérias sobre infância e adolescência publicadas por cada veículo, os assuntos mais abordados e as fontes de informação mais ouvidas pelos jornalistas. Ao distribuir de forma ampla o relatório analítico, a ANDI busca oferecer à sociedade um retrato detalhado das contribuições que a mídia brasileira vem dando à causa da infância e adolescência. Ao mesmo tempo, acreditamos que os profissionais de comunicação necessitam de um balizamento tecnicamente consistente sobre a forma como vem desenvolvendo a cobertura de temáticas tão cruciais. É nesse sentido, por sinal, que em sua edição de março 2003 o relatório destacou um novo tipo de ranking, capaz de avaliar de forma aprofundada o compromisso dos jornais com os direitos da infância e da adolescência. São computados, entre outros elementos, o destaque dado à legislação e as políticas públicas, o tratamento dispensado à cobertura de temas estratégicos (como educação, saúde e violência) e o investimento na criação e manutenção de suplementos especializados para os públicos infantil e juvenil.

3) RS – Qual a sua avaliação a respeito do envolvimento e engajamento da mídia brasileira no objetivo final de proteger crianças e adolescentes?
VV – Dados das pesquisas regularmente realizadas pela ANDI e seus parceiros demonstram que os temas relativos à infância e adolescência entraram, definitivamente, para a agenda pública nacional. Um bom exemplo está no fato do volume de reportagens sobre estes assuntos nos principais 50 jornais do País ter crescido mais de 800% entre 1996 e 2002. Ou seja, esta pauta está integrada ao cotidiano das redações, nas mais diversas regiões do País. Fala-se muito mais sobre os problemas que atingem as crianças e as soluções implementadas – um cenário certamente muito mais positivo que aquele da primeira metade do anos 90. Mas há também dificuldades, relativas à complexidade e às especificidades das diferentes questões relacionadas à infância. Áreas como desenvolvimento infantil, violência sexual, adolescentes em conflito com a lei, inclusão escolar de crianças com deficiências, discriminação racial na sala de aula, política de drogas – só para citar algumas –, precisam necessariamente de um olhar mais aprofundado. Não é possível seguir apenas trabalhando os dados mais gerais, sem discutir de forma detalhada as estratégias para seu enfrentamento. Por outro lado, nem sempre as fontes de informação estão preparadas para apoiar a imprensa da maneira que seria desejável; isso também compromete a qualidade da notícia. Outro grande desafio que se coloca para a imprensa brasileira diante da pauta da infância e da adolescência, talvez o principal deles, está em responder à agenda do atual Governo Federal, que contempla a questão social com mais ênfase do que os anteriores. É preciso entender que os jornalistas só conseguirão contribuir para o estabelecimento de um debate público mais consistente em relação a essa agenda caso busquem meios de se capacitar para isso. De outra forma, ficaremos limitados a matérias pontuais, que não investigam a lógica que move as políticas para essa área nem avançam rumo a um monitoramento de resultados. Para isso, um dos primeiros passos é ampliar o foco de abordagem, de maneira a torná-lo mais transversal, explorando a interface das questões sociais em geral – e as da infância e adolescência em particular – com aspectos relacionado à política e à economia.

4) RS – Quais são os principais projetos desenvolvidos pela Andi?
VV – Ao longo destes 11 anos de atividades, três eixos estratégicos – Mobilização, Análise e Qualificação – orientam as diversas iniciativas da ANDI. Além disso, temos investido em projetos de replicação das metodologias que foram desenvolvidas nesse período. Estarei destacando algumas das ações a seguir, mas uma visão bastante detalhada de todas elas estão disponíveis por meio do link http://www.andi.org.br/_pdfs/ANDI_no_presente.pdf. Dentre as estratégias de mobilização, é possível citar aquela responsável pela interação diária com as redações de todo o País, por meio seja do envio de sugestões de pauta, seja do atendimento às demandas dos jornalistas, que nos contactam em busca de fontes de informação ou de dados sobre determinados temas. É nesse contexto também que surge, em 1997, o projeto Jornalista Amigo da Criança, que reconhece profissionais de imprensa que ao longo de suas carreiras têm priorizado os temas da infância e da adolescência. Em relação às ações de análise de mídia, realizamos diariamente a leitura das edições de 58 jornais de todas as regiões do País, além de monitorar dez revistas de circulação nacional. Inicialmente, por meio de processos de clipagem eletrônico e manual, são identificadas as reportagens que abordam todo e qualquer aspecto relacionado à infância e adolescência. É a partir delas que são elaborados os clippings da ANDI, como o Infância na Mídia Hoje (diário, eletrônico) e a Análise do Clipping (semanal, impresso). Na mesma vertente, se encontra o relatório anual Infância na Mídia, desenvolvido em parceria com o Instituto Ayrton Senna. Já no que diz respeito à qualificação, é importante citar a realização regular, desde 1999, de Grupos de Análise de Mídia em que se reúnem especialistas e jornalistas convidados, além de profissionais da própria ANDI e das instituições parceiras, para a produção de um documento contendo avaliações sobre a qualidade da cobertura que a imprensa vem oferecendo a um determinado assunto de interesse para a área da infância e da adolescência. Geralmente são analisadas em torno de 1 mil reportagens em cada um destes grupos, por meio de uma metodologia quanti-qualitativa. Os documentos resultantes destas análises têm sido veiculados na série Mídia e Mobilização Social, parceria com o Unicef e a Cortez Editora. Além disso, vale destacar a realização de Seminários e Oficinas de Mídia, que congregam jornalistas e especialistas para debater as conclusões dos Grupos de Análise de Mídia e gerar recomendações e sugestões para uma cobertura mais substanciada das temáticas em foco. Um outro projeto que consideramos especialmente importante e que, de certa forma, trabalha simultaneamente esses três eixos de ação, é o da Editoria de Mídia Infanto-Juvenil. Tanto as publicações dirigidas especificamente ao público adolescente e jovem quanto aquelas focadas nas crianças são monitoradas e avaliadas regularmente pela ANDI, que busca ainda apoiar os profissionais desses veículos no desenvolvimento de suas pautas. Desde 1997, quando o projeto foi inaugurado, uma série de pesquisas sobre este segmento da mídia brasileira também tem sido construída pela editoria. Finalmente, há a linha estratégica de replicação. Em março de 2000, foi criada a Rede ANDI de Comunicadores pelos Direitos da Infância – Brasil, formada por organizações de comunicação de diversas regiões, que atuam na defesa e promoção dos direitos da criança e do adolescente com o objetivo de consolidar uma cultura de comunicação, nas empresas jornalísticas e entre as fontes de informação, que priorize as pautas relevantes para a promoção e defesa dos direitos da infância e adolescência. Em 2003, em moldes similares, nasce a Rede ANDI América Latina, que já reúne oito organizações, além da própria ANDI.

5) RS – Existe alguma idéia futura a ser implementada em breve? Se houver, pode comentá-la?
VV – A ANDI procura permanentemente trabalhar no aprimoramento e reavaliação de suas ações. Nesse momento, acreditamos ser fundamental priorizar, em nossa agenda, o desenvolvimento de iniciativas que ampliem o relacionamento com o mundo acadêmico. Acreditamos que as questões estratégicas da agenda da infância e adolescência possam marcar maior presença nos programas de ensino, pesquisa e extensão das universidades – com destaque para os cursos de Comunicação Social. Estamos avaliando diversas possibilidades nesse sentido, entre elas a viabilidade de estruturar uma Cátedra de Jornalismo pelos Direitos da Infância e da Adolescência. Um dos passos na direção de contribuir com o ensino de jornalismo foi o lançamento, em maio de 2003, da série de livros Mídia e Mobilização Social. Além de uma leitura crítica da cobertura dada a um determinado assunto, cada livro traz recomendações para um aprimoramento do trabalho dos meios de comunicação, artigos de especialistas, entrevistas com repórteres e editores, sugestões de pauta, glossário e diretório guia de fontes (que relaciona as principais organizações e especialistas naquele determinado tema focal). Até o final de 2003, seis volumes haviam sido lançados, tendo como foco o trabalho da imprensa brasileira diante de temáticas da relevância de educação para a primeira infância; pobreza, desigualdade e desenvolvimento humano e social; consumo de tabaco e álcool por adolescentes; abuso e exploração sexual; saúde infantil e trabalho infantil doméstico. Outro projeto extremamente importante, também para ser implementado ao longo dos próximos anos, é a Rede ANDI América Latina. A Rede têm como objetivo central apoiar em outros países a multiplicação de ações de comunicação comprometidas com os direitos da infância e da adolescência, sempre a partir da ótica do desenvolvimento humano e social. Essa é uma ação muito desafiadora, porque significa trabalhar a transferência de metodologias e estratégias desenvolvidas no Brasil para outras realidades. Além da língua, são muito diversos os contextos sociais, culturais, econômicos e a própria situação dos meios de comunicação, no que diz respeito a seu grau de maturidade diante de uma prática de responsabilidade social. A Rede ANDI América Latina foi estabelecida em 30 de setembro de 2003, em Brasília, por organizações não governamentais de oito países, além do Brasil: Argentina, Paraguai, Bolívia, Colômbia, Venezuela, Costa Rica, Nicarágua e Guatemala. Em janeiro de 2004 inicia o processo de treinamento das equipes e, em março, as atividades em cada país.

6) RS – Qual o retorno que a ANDI tem obtido com a instituição do projeto Jornalista Amigo da Criança?
VV – O projeto nasceu da idéia de reconhecer publicamente aqueles profissionais que demonstravam comprometimento com uma prática jornalística alinhada com os direitos da infância e da adolescência, contribuindo assim para a construção de novos valores na sociedade. Fundação Abrinq e o Unicef participaram do processo de implementação do projeto, que hoje é patrocinado pela Petrobrás. Atualmente, 285 profissionais que trabalham em jornais, revistas, rádios e televisões das diversas regiões do País possuem o título de Jornalista Amigo da Criança. Após esses anos de projeto, é possível constatar que esses comunicadores se consolidaram como referência dentro e fora de suas redações, quando as questões relacionadas à infância e à adolescência estão no centro da pauta. Vários deles têm se destacado também seja como finalistas, seja como vencedores de prêmios importantes na área de mídia e infância, como o Grande Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo e os Prêmios Ibero-americanos de Comunicação pelos Direitos da Infância e da Adolescência. Além disso, acho interessante destacar que a repercussão da iniciativa já ultrapassa o universo das redações. A ANDI recebe anualmente centenas de e-mails de estudantes universitários, de entidades que desenvolvem trabalhos com crianças e adolescentes e de profissionais de diversas áreas, todos buscando informações sobre o projeto, seja em relação aos critérios de participação, seja na intenção de divulgar informações relevantes junto à rede.

7) RS – Na sua opinião, qual a principal ameaça que existe hoje no Brasil contra o bem-estar da infância?
VV – Não dá para definir apenas uma grande ameaça aos direitos de nossos meninos e meninas. Um dos grandes problemas é que, na verdade, ainda não está implementado na sociedade, nos governos e nas empresas aquilo que estabelece o artigo 227 da Constituição Federal: a criança é prioridade absoluta das políticas e dos investimentos. Se a lei fosse respeitada, talvez muita coisa estivesse diferente. Outra ameaça é a não existência dos Conselhos Tutelares em muitos municípios e o mau funcionamento deles em diversas outras cidades. É importante lembrar que o Estatuto da Criança e do Adolescente determina a presença desses órgãos, encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e dos adolescentes, em todos os municípios brasileiros e que os recursos necessários ao seu funcionamento deverão constar na Lei Orçamentária Municipal. Além disso, há ainda a visão de que a redução da maioridade penal, levando adolescentes de 16 anos ou menos para as prisões que abrigam adultos, seria uma das soluções para os altos índices de criminalidade do País, um reflexo da visão punitiva e repressiva que ainda impera sobre a infância e a adolescência.

8) RS – Como o senhor define o conceito de Responsabilidade Social?
VV – Na ANDI utilizamos como norteador o conceito definido pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, segundo o qual “Responsabilidade Social é uma forma de conduzir os negócios da empresa de tal maneira que a torna parceira e co-responsável pelo desenvolvimento social. A empresa socialmente responsável é aquela que possui a capacidade de ouvir os interesses das diferentes partes (acionistas, funcionários, prestadores de serviço, fornecedores, consumidores, comunidade, governo e meio-ambiente) e conseguir incorporá-los no planejamento de suas atividades, buscando atender às demandas de todos e não apenas dos acionistas ou proprietários”.

9) RS – Na sua opinião, o que pode ser feito para otimizar a atuação do Terceiro Setor no Brasil?
VV – É preciso que as organizações não-governamentais, institutos, fundações e todas entidades que compõem esse setor dispensem maior atenção ao planejamento de suas ações, à avaliação de resultados e à medição de impactos. Essas informações são fundamentais para facilitar o diálogo do Terceiro Setor com os demais setores da sociedade e também para garantir maior visibilidade aos resultados gerados a partir da ação desenvolvida. Também é importante que as organizações do Terceiro Setor reconheçam a importância e priorizem a elaboração de planos de comunicação, importantes aliados na divulgação destes impactos e resultados.

Do Site: www.andi.org.br


Postado por Carmen Gattás

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